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  • Cegueira botânica: o mal do século

    Imagem da capa: Tropical - Anita Malfatti Em um passado distante, o domínio e percepção do meio ambiente era fundamental para a sobrevivência do Homo sapiens. Os conhecimentos e as relações com os outros seres vivos foram fatores cruciais para o processo evolutivo. Um passo muito importante na nossa história, foi a utilização de espécies vegetais para diversos fins. Foi a partir dos conhecimentos adquiridos e transmitidos por diversas gerações, que nossos antepassados sabiam o que dava para comer e o que não dava, qual espécie ajudava em ferimentos, qual espécie podia servir de alimento para outros animais, qual causava reações alérgicas, etc. Não saber se um fruto de uma determinada planta podia ser venenoso ou não, era contar com a sorte em um mundo sem segundas chances. E, saber se uma espécie encontrada na natureza podia aliviar dor ou melhorar alguma doença, era viver com melhor qualidade de vida. Com o surgimento da agricultura as plantas passaram a ter um papel fundamental no aumento das populações humanas. Passamos a domesticá-las, reproduzindo-as em grandes plantações, aumentamos e modificamos seus frutos que levaram anos sendo moldados pelas pressões evolutivas da natureza, para que suprissem as necessidades nutritivas das pessoas. Assim, a agricultura trouxe maior disponibilidade de alimentos, o que possibilitou mais pessoas se alimentando e sobrevivendo às adversidades do meio, como o frio intenso na época de inverno, por exemplo. Além da agricultura, outra época muito importante da história da humanidade, diretamente interligada com as plantas, foi o comércio de especiarias, produtos de origem vegetal, tais como o cravo-da-índia, um botão floral da espécie Syzygium aromaticum da família Myrtaceae, a canela, obtida pela casca da espécie Cinnamomum verum da família Lauraceae, ou a pimenta-do-reino, fruto da espécie trepadeira Piper nigrum da família Piperaceae. Durante muito tempo as diferentes sociedades tiveram como base do seu funcionamento a exploração de recursos vegetais. Impérios e nações foram construídos e guerras foram travadas pela disputa desses recursos. Como não mencionar a guerra do ópio que aprendemos nas aulas de história, uma substância extraída da papoula, nome popular da espécie Papaver somniferum da família Papaveraceae. Com o decorrer da história da humanidade e o desenvolvimento de diferentes tecnologias, a relação homem-natureza mudou bastante, e as plantas, com todos os seus recursos oferecidos, foram dividindo a importância com outras fontes de recursos que atendiam às necessidades dos novos tempos, como os combustíveis fósseis e metais para a fabricação das tecnologias. Cada vez mais, o conhecimento botânico deixou de ser uma necessidade e foi se tornando algo primitivo. E quais as consequências disso? Uma sociedade em que as pessoas conhecem muito pouco sobre plantas, consequentemente não sabe da importância dessas para os ecossistemas e para o funcionamento do mundo ao seu redor, pois, as plantas estão presentes no nosso dia a dia em diferentes formas, mesmo que isso não seja tão perceptível. Então, não é apenas sobre as árvores na amazônia, é também sobre o que você come nas suas refeições, sobre o que você veste, sobre a disponibilidade de água na sua região, sobre o remédio que você usa, sobre a qualidade do ar que você respira, sobre o preço da carne do seu churrasco, enfim, as plantas não são apenas a base dos ecossistemas como são base do funcionamento da vida do Homo sapiens, desde milhares de anos atrás. O desconhecimento sobre as plantas ao seu redor e no seu dia a dia passou a receber o nome de cegueira botânica. Se não entendemos muito bem alguma coisa, não sabemos sua real importância. No texto abaixo, tento mostrar por que a cegueira botânica é o mal do século e por que precisamos combatê-la. Os pilares de funcionamento da natureza O surgimento das plantas terrestre e a ocupação do meio por essas, possibilitou uma maior disponibilidade de O₂ na atmosfera, o que levou ao desenvolvimento de formas de vida dependentes desse gás. Além disso, por serem fotossintetizantes, ou seja, captam a luz solar e a transformam em moléculas orgânicas, as plantas são base da alimentação de diversos seres vivos. É como aprendemos nas aulas de biologia: as cadeias e teias alimentares possuem vários níveis, onde temos os produtores, consumidores e decompositores. Os produtores são os organismos que sustentam as cadeias e teias alimentares, servindo de alimento para os consumidores primários, que são geralmente os herbívoros. Então, para uma onça-pintada existir ela precisa se alimentar de outros animais, como uma capivara, por exemplo, a capivara, por sua vez, por ser um animal herbívoro, alimenta-se exclusivamente de plantas. Vamos imaginar que uma determinada área de floresta foi desmatada, queimada e posteriormente ocupada por gado. Toda vegetação foi modificada e agora existem poucas opções para as capivaras daquela região e elas passam a competir com o gado por alimento e território. Com menor quantidade de habitat e disponibilidade de comida, as capivaras se alimentam menos, portanto ficam mais desnutridas e suscetíveis a doenças e predadores, o que leva a morte dos indivíduos e diminuição rápida da sua população. Com menos capivaras para se alimentar, quem passa a sofrer é a onça-pintada, que precisa correr atrás de outras presas, que também estão diminuindo graças ao desmatamento. A onça é um animal muito emblemático que muita gente conhece e luta pela sua conservação, mas, pouco se sabe que também é preciso conservar e proteger os outros seres vivos da cadeia alimentar, principalmente os produtores, e nesse caso, a vegetação, as plantas, já que sem elas o animal perde habitat e ocorre uma reação em cadeia que leva a diminuição de suas presas. Uma das maiores dificuldades de conservar animais de topo de cadeia, como a onça-pintada, é que também precisamos conservar o seu habitat, precisamos conservar áreas de vegetação nativa. Quando é feito um trabalho de conservação de alguma espécie de animal, as pessoas até entendem a importância do bicho e da sua preservação, mas não entendem por que não podem desmatar para ter suas plantações e criações de gado, não associam que aquilo afeta a vida dos outros animais, e que afetará a vida delas consequentemente. Graças a cegueira botânica, muitas vezes consideram que é tudo mato e desmatam tranquilamente. Os serviços que as plantas nos prestam Os ecossistemas são uma grande máquina em constante funcionamento e nesse processo, como consequência, alguns serviços podem ser prestados à humanidade, os chamados serviços ambientais. Pretendo falar um pouco mais sobre eles em um próximo texto. Comentei um pouco sobre esses serviços no texto de Sistemas Agroflorestais. Existem vários tipos, realizados por vários organismos. Nesse tópico tentarei abordar alguns realizados pelas plantas. No tópico acima, falei que as plantas fornecem bastante O₂ para a atmosfera graças ao processo de fotossíntese. Mas, não podemos esquecer que para funcionar, a fotossíntese precisa de outro gás, o CO₂. Então, além de fornecer O₂, elas retiram CO₂ do meio, melhorando a qualidade do ar e diminuindo os impactos do efeito estufa que tem esse gás como um dos principais protagonistas. Esse seria o primeiro serviço ecossistêmico das plantas, importantíssimo para nossa sobrevivência. O segundo serviço ecossistêmico está relacionado com o cilo da água pelas suas raízes e a evapotranspiração que auxilia na formação de chuvas. A malha de raízes no solo age como um tipo de bacia, segurando a água e impedindo a sua rápida evasão. Deslizamentos de terra em áreas de construções irregulares, como encostas de morros, ocorre justamente por conta da retirada da vegetação que existia ali. Vemos isso se repetir todo ano durante a época de chuvas fortes. Sem as raízes, o solo não consegue reter água. A longo prazo isso causa assoreamento de corpos d’água e erosão do solo. Quanto a evapotranspiração, é um processo onde ocorre a liberação de água para a atmosfera em forma de vapor, através dos corpos d’água como rios, lagos e oceanos, e, através das plantas. A água que entra lá pelas raízes, é transportada pelo corpo vegetal e sai por pequenos poros nas folhas e depois fica em estado gasoso e se junta a massa de umidade formando posteriormente as chuvas. Essas chuvas podem alcançar grandes distâncias e abastecer vários corpos d’água, como o caso dos rios voadores da Amazônia. Fonte: página do Facebook Árvore, ser tecnológico Falando sobre benefícios para a saúde humana, as plantas sempre foram usadas pelo Homo sapiens para melhorar a qualidade de vida. Até hoje, as chamadas plantas medicinais auxiliam no tratamento de várias enfermidades e são usadas por vários povos originários, quilombolas e por comunidades carentes que possuem poucos acessos ao sistema de saúde. Quando não usadas diretamente, as plantas fornecem os compostos químicos para a fórmula de diversos fármacos. Existem milhares de compostos químicos, correndo dentro do corpo de várias plantas que a humanidade ainda não conseguiu estudar, e esses compostos podem ajudar a solucionar várias doenças com as quais lutamos há muito tempo, como, por exemplo, câncer, mal de Parkinson, alzheimer, ou doenças mentais como ansiedade e depressão, ambas consideradas pelos médicos como o mal do século. Na verdade, já existe uma planta que mostra grande potencial para lidar com essas doenças mentais, mas ela não só é proibida como é criminalizada. Sim, estou falando da maconha (Cannabis sp.). Mas, talvez o maior serviço prestado pelas plantas para a humanidade seja o de alimentação. Sem elas, os nossos antepassados ao menos teriam conseguido energia para descer das árvores e adotar uma postura ereta. O milho, por exemplo, sustentou sociedades como a dos Astecas. Já o trigo foi responsável pela ascensão das sociedades mesopotâmicas. E o que falar do Brasil, né!? Um país que assim como os seus vizinhos latino americanos, foi fundado pelo extrativismo vegetal, seja ele do pau-brasil, da cana-de-açucár, café, algodão, milho ou da soja. A cegueira botânica tem como uma de suas consequências a não visualização de outras plantas que também servem como alimento, mas são tratadas como sendo apenas mato, as chamadas plantas alimentícias não convencionais (PANC). Muitas dessas plantas são bastante ricas em nutrientes e ocorrem em abundância na natureza e são de fácil acesso. Algumas são encontradas em qualquer jardim ou em terrenos baldios. Muitas delas também são nativas e muito bem adaptadas às condições ambientais de uma determinado ecossistema, o que tira a necessidade de modificações nas áreas de plantio para cultivá-las. É graças a essa falta de importância atribuída às plantas que muito desmatamento ocorre. Afinal, “é só uma árvore”, “é só mato”. A cegueira botânica pode, sim, ser considerada o mal do século, pois, como foi elucidado precisamos das plantas para absolutamente tudo na nossa vida, inclusive para sairmos desse caos ambiental que a humanidade se encontra. Mas como vamos fazer isso se nem ao menos podemos enxergá-las de verdade? Precisamos ter um olhar diferente para esses seres vivos. Um olhar botânico, que consiga ver, além da beleza, a grande importância desse grupo para a manutenção da vida no planeta. E isso pode ser construído principalmente através da educação ambiental. Essa parte final do texto direciono para profissionais da área ambiental. Nós também temos responsabilidade nesse processo e precisamos levar para as pessoas a importância e beleza das plantas, fazer elas se apaixonarem por esse grupo assim como se apaixonam pelos animais que dependem delas para sobreviver. Referências https://ciprest.blogspot.com/2019/05/cravo-da-india-syzygium-aromaticum.html http://historiaupf.blogspot.com/2016/03/1857-potencias-ocidentais-atacam-china.html https://www.gardenia.net/plant/papaver-somniferum-laurens-grape https://museudouniversodafarmacia.com.br/acervo/moleculas-da-natureza/papaverina/ https://www.salveasflorestas.ufv.br/?page_id=292 https://donozen.com.br/jatoba-como-plantar-essa-arvore-cheia-de-beneficios/ Oliveira Jr, C. J. F. de, Amador, T. S., Cécel, A. T., & Barbedo, C. J. (2022). Porque não comemos nossa saudável biodiversidade?. Brazilian Journal of Agroecology and Sustainability, 4(2). Recuperado de https://www.journals.ufrpe.br/index.php/BJAS/article/view/4961.

  • Café: uma planta capaz de moldar a história

    Foto da capa: http://www.penagosmontealegre.com.br Sexta-feira passada, 14/4, foi o dia mundial do café. Uma das bebidas mais consumida no mundo, proveniente, é claro, de uma planta. Como bom apreciador de café, eu não teria como não escrever sobre essa planta tão incrível que fornece esse produto capaz de te trazer de volta a vida para enfrentar a sua rotina, e ser uma pessoa útil e produtiva na sociedade. E que, além de tudo, assim como o cacau que escrevi sobre, na semana passada, também tem uma grande importância socioambiental no Brasil. Na verdade, o cafeeiro foi uma das primeiras plantas que ajudou a levantar o nosso país. O café tem uma história interessante sobre a origem do seu uso. Diz-se que pastores, lá na região da Etiópia, observaram que suas cabras estavam se alimentando de frutos vermelhos de uma planta misteriosa, e que esses animais depois de um tempo ficavam cheios de disposição e energia, subindo morros e montanhas com facilidade. Os pastores passaram a consumir os frutos dessa planta e constataram que realmente forneciam mais disposição e energia. Intrigados, levaram a planta para os monges locais identificarem, mas esses também não a conheciam. Os monges experimentaram o fruto, e não deu outra, ficaram apaixonados e passaram a cultivar a planta. Esse gosto pelo fruto também se espalhou pela população que o consumia em diversas formas. Então, a planta se dispersou pelo continente africano, através do comércio de mercadorias, até chegar na região da Arábia e cair no gosto dos árabes. Eles dominaram o plantio e preparo do café, consumindo-o de diferentes maneiras até chegar na bebida obtida pela torra dos grãos de hoje em dia. O sucesso do café entre os árabes fez surgir o interesse pelos países europeus, como a Holanda, Itália, Alemanha e França, que passaram a produzi-lo nas suas colônias. E com o tempo, o café foi se espalhando pelo mundo, em suas diferentes formas e sabores, até se tornar uma das bebidas mais consumida pelo ser humano. No Brasil, o cafeeiro foi uma planta que trouxe diversas mudanças econômicas, sociais e políticas. Seu cultivo no nosso país começou no estado do Pará, se espalhou por alguns estados da região nordeste, até chegar no Rio de Janeiro e posteriormente em São Paulo, o qual foi o maior produtor de café no mundo durante o século XIX e início do século XX. Apesar da sua importância, o café no Brasil não possui uma história bonita para ser contada. A produção do café no país ocorreu nos moldes de exploração com grandes áreas de monocultura, assim como era a cana-de-açúcar, visando o mercado internacional e usando mão de obra escrava e assalariada. O seu cultivo em larga escala, principalmente entre os séculos XIX e início do XX, buscando quantidade e não qualidade e equilíbrio com a natureza, foi responsável por desmatar grandes áreas de floresta nativa na Mata Atlântica e causar empobrecimento do solo nas áreas de cultivo. Como exemplo de caso real desses problemas, podemos citar a principal região produtora de café no início da sua expansão, o Vale do Paraíba, que se tornou uma região de solo infértil e causou prejuízo para diversos fazendeiros. Hoje, o café ainda é uma das commodities de maior valor agregado no Brasil. Porém, agora tem ganhado destaque principalmente pela produção orgânica feita por diversas famílias de assentamentos por diferentes movimentos sociais em diferentes partes do país. As plantações de cafeeiro feitas por essas famílias, assim como o cacau e outras variedades, cresce em harmonia com a natureza através dos sistemas agroflorestais, sendo assim, uma importante espécie socioambiental, pois gera renda para pequenos e médios produtores, especialmente os que vivem em assentamentos, além de ser produzido de forma que se integra a natureza, respeitando seus ciclos e ajudando na sua conservação. Trouxe nesse texto um olhar botânico para o café, além de destacar a sua importância socioambiental, mostrando casos de famílias que plantam cafeeiro para complementar a renda, provando que é possível usar essa commodity a favor do meio ambiente e como uma das alternativas para diminuir as desigualdades no nosso país. Aspectos botânicos da planta que faz o seu cafezinho O café, é um produto que pode ser obtido por meio de diferentes espécies que pertencem ao gênero Coffea L. da família Rubiaceae, mas duas espécies se destacam em termos de produção mundial, Coffea arabica (variedade arábica) e Coffea canephora (Variedade robusta). Outras espécies cultivadas em menor escala são o Coffea liberica (café Libérica) e o Coffea dewevrei (café Excelsa). Como falei no começo do texto, o gênero é nativo da África tropical das regiões da Etiópia e Congo. Quanto a sua taxonomia, é difícil ter uma descrição precisa, já que o gênero tem bastante diversidade, mas, em geral, é um arbusto ou arvoreta que pode alcançar cerca de 4 m de altura. Suas folhas são de coloração verde-escuro e possuem um brilho típico, são coriáceas, alternas e elípticas. Suas flores nascem em inflorescências axiais, entre a base do pecíolo e o ramo, e a cor varia entre as espécies. A flor é hermafrodita, possui pétalas e sépalas, estames em número de 5 com abertura longitudinal. O fruto formado após a polinização das flores, que pode ser feita principalmente por abelhas do gênero Apis, é constituído por uma casca externa conhecida como exocarpo e envolve a polpa, a mesma que foi utilizada para preparar bebidas logo no início da descoberta da planta, que possui um gosto adocicado a amargo em algumas espécies. A polpa envolve as sementes, que é onde está o maior interesse econômico da planta, pois é através da sua torra que será obtido o café. Uma importante substância presente na semente do café é a cafeína, um alcaloide que na planta acredita-se ser responsável por inibir a germinação da semente, e no ser humano exerce estímulo sobre o sistema nervoso central, bloqueando os receptores de adenosina, um neuro transmissor responsável por nos induzir ao sono. Então é por isso que o café dá aquela levantada. Só que, se tratando de alcaloide, categoria de substância química que pode causar vício e dependência, a cafeína em excesso pode ser um problema. Porém, a mesma possui vários benefícios para a saúde humana. Imagina ser uma planta e dominar uma espécie considerada superior para se dispersar ao redor do mundo e ocupar vários habitats através de uma substância química viciante? Bom, essa é Coffea, um exemplo de caso de sucesso evolutivo. Aprender com o passado para um novo futuro Como foi elucidado no texto, a produção de café no Brasil seguiu moldes extremamente prejudiciais à natureza desde a época colonial, crescendo em sistemas de monocultura a pleno sol, ou seja, em áreas abertas por desmatamento, isso devido à alta demanda do mercado e visando o lucro da produção. É interessante pontuar que, o cafeeiro é uma planta que na natureza cresce em áreas com árvores que causam sombreamento nele. É considerada uma planta de bosque e não de pleno sol. A cafeicultura no Brasil, desde a época que era uma colônia, trouxe consigo não só problemas ambientais como foi responsável por acentuar diversos problemas sociais no país. Nesse período, por muito tempo, a principal mão de obra era de escravos africanos, responsáveis por diversas atividades nos cafezais dos seus senhores. Após a abolição, a cafeicultura passou a utilizar a mão de obra barata dos imigrantes europeus que chegavam ao Brasil. Esses tinham péssimas condições de trabalho, análogas à escravidão. Infelizmente, o cultivo de café em grandes lavouras ainda é responsável por diversos casos de trabalho escravo todos os anos, mesmo com a commodity vendendo bastante e gerando bastante lucro para a economia do país. Os trabalhadores rurais passam por trabalho forçado, jornadas exaustivas, servidão por dívidas e condições laborais degradantes como não ter banheiro no local de trabalho, camas improvisadas, ausência de um local para refeição, etc. Sem falar nos casos de trabalho infantil que também ocorre nessas lavouras. Em contrapartida, um novo modelo de produção que vem sendo divulgado, orgânico e agroecológico tem se destacado no mercado do café, feito principalmente por famílias de assentamentos, quilombolas e povos indígenas. Esse tipo de produção mostra ser possível produzir café de forma ecológica, gerar renda, respeitar o meio ambiente e ainda emancipar trabalhadores rurais e populações tradicionais. Um exemplo desse tipo de produção é mostrado em dois documentários feitos pelo MST que deixo nos links abaixo. Café com sabor de Resistência! Sabor da Terra: A experiência da produção de café da Bahia Isso por que, ao contrário do modelo tradicional, esses cultivos visam a qualidade e não a quantidade, portanto, desenvolvem-se em respeito com os ciclos ecológicos locais. A planta cresce em áreas de florestas, com outras árvores fazendo sombreamento, assim como a espécie ocorre na natureza. Além do café, nesse modelo agroecológico os produtores desenvolvem outros cultivos junto com o cafeeiro, como, por exemplo, bananas, cacau, mandioca, castanha, açaí, entre outros, fazendo com que diminua a dependência sob a safra do café. O plantio entre a vegetação nativa também oferece melhor qualidade no solo e consequentemente não recorre a fertilizantes. O cultivo do café em SAFs é uma prática que precisa ser divulgada e ensinada para pequenos e médios produtores, para os que ainda utilizam sistemas de plantio convencional, já que muitas vezes essa foi a maneira de produzir que lhes foi ensinada, fazerem a transição agroecológicas em suas terras. Para isso, devemos contar com a educação ambiental, que pode mostrar a esses produtores como produzir de forma diferente, com esses sistemas agroflorestais, que, apesar de ter seus desafios para ser implantado, a longo prazo traz vários benefícios para os próprios produtores. Como consumidores, é importante incentivar as produções de café de pequenos e médios produtores rurais, principalmente os que vem das famílias de assentamentos e povos tradicionais, comprando seus produtos disponível em mercados locais ou online. Quanto mais incentivarmos, falarmos sobre esses produtos e as famílias que os produzem, mostrarmos os seus benefícios, mais demanda sob o mesmo será gerada. Já as grandes empresas e supermercados que atuam nas cadeias produtivas de café, é necessário que haja fiscalização com relação a produções que submetem trabalhadores a condições análogas a escravidão e que passem a dar preferência por cafés produzidos de forma agroecológica. Apesar do café não ser uma planta nativa, chegou ao nosso país e desencadeou uma série de mudanças, na sua maioria não positivas. É interessante pensar que o café que tomamos no dia a dia é uma planta que carrega bastante história, e não só dominou nosso paladar como também foi, e ainda continua sendo, responsável por mudanças na história da nossa sociedade. Referências https://www.ico.org/pt/botanical_p.asp#bot https://www.embrapa.br/en/busca-de-projetos/-/projeto/205976/e-mipcafe---tecnologia-da-informacao-para-o-manejo-integrado-de-pragas-e-doencas-do-cafeeiro http://rotadocafeparana.blogspot.com/2014/11/a-flor-do-cafe.html https://www.cooperbatata.com.br/culturas/cafe. https://www.ecodebate.com.br/2015/10/09/o-impacto-da-cultura-do-cafe-no-meio-ambiente-do-brasil-do-seculo-xviii-ao-xxi-artigo-de-sandra-marcondes. Lopes, P. R., Kageyama, P. Y., & Lopes, K. C. S. A. (2014). Sistemas Agroflorestais e Produção Agroecológica de Café na Região do Pontal do Paranapanema. Martins, Ana Luíza. História do café - São Paulo, contexto, 2012. Peruzzolo, M., Cruz, B. C. F. da, & Ronqui, L. (2019). Polinização e produtividade do café no Brasil. Pubvet, 13(04). https://doi.org/10.31533/pubvet.v13n4a317.1-6.

  • Cacau: para além do chocolate

    Foto da capa: Crush Boone/The Tico Times A páscoa acabou de passar, mas a minha vontade de comer chocolate não. Isso porque não tem época nem hora para comer chocolate, né!? Como bom chocólatra, decidi fazer um post falando desse produto que esteve em alta na semana passada. Na verdade, decidi falar sobre a planta que dá origem a ele, o cacaueiro. A princípio seria apenas um post botânico para falar da árvore, mas o cacaueiro é uma planta muito interessante, diretamente relacionada a vários outros temas, principalmente no âmbito socioambiental, o que é perfeito, pois sempre tento trazer essa temática nos textos do meu blog. Os primeiros apreciadores do fruto O chocolate, como vocês bem devem saber, é um produto que vem do fruto chamado de cacau, de uma planta conhecida como cacaueiro, ou pé de cacau, com nome científico Theobroma cacao. O primeiro nome dessa espécie, Theobroma, em grego significa alimento dos deuses, e, não porque o chocolate é gostoso demais, mas pela origem do uso do cacau. Os Astecas apreciavam bastante esse fruto e o consumiam em uma bebida amarga, misturada com milho e outras especiarias, a dos nobres e guerreiros era misturada com mel, conhecida como tchocolath. Eles acreditavam que o cacau era um fruto dada pelo Deus Quetzalcoatl, o Deus serpente e era tão importante para o império Asteca que servia como moeda de troca. Após a colonização e genocídio dos povos Astecas pelo espanhol Hernando Cortez, a produção de cacau ficou nas mãos dos espanhóis e foi levada para a Europa, e o chocolate, agora mais refinado e com outros preparos, passou a ser o alimento preferido da nobreza. Então vários países passaram a produzi-lo, incluindo as colônias como Brasil, Venezuela, Equador, Gana, etc. O produto era uma grande novidade na época e poucas pessoas sabiam o que e como era um cacaueiro, sequer sabiam que aquilo era obtido de uma planta. Bom, atualmente não é difícil achar alguém que nunca tenha visto um cacau, ou um cacaueiro. Imagina então a flor! É a chamada cegueira botânica (assunto que pretendo trazer em outro texto). Um olhar botânico sob a espécie O cacau nasce de uma flor pequena (ca. de 5 cm), de coloração branca a rosada, que fica disposta em inflorescências caulinares. Essas flores são consideradas hermafrodita, ou seja, possui estruturas reprodutivas que abriga ambos os gametas, no caso das plantas, o grão de pólen e o óvulo. É através da polinização, encontro do pólen com o estigma, que pode ser feita por moscas, formigas e principalmente mosquitos, ou até manualmente, que o cacau vai surgir. Seus principais polinizadores são mosquitos do gênero Forcipomyia. O fruto é então formado no ovário da flor que passa por diversas mudanças e se transforma no cacau que conhecemos. As sementes são envoltas por uma substância branca e carnosa, conhecida como arilo. Para a obtenção do chocolate essas sementes precisam passar pelo processo de fermentação que vai retirar esse arilo e depois serão colocadas para secar. É da semente após seca, que passa a receber o nome de amêndoa, de onde é retirado o principal ingrediente para fazer o chocolate, o pó de cacau. Após a fermentação e secagem das sementes ocorre o processo de torra que leva a obtenção da farinha. A partir dessa farinha que são produzidos os diferentes tipos de chocolates, ao leite, meio amargo (meu favorito), amargo, etc., que movimentam milhões na economia de diversos países. Cacau e seu potencial socioambiental Atualmente, o cacau tem se destacado no Brasil como uma alternativa para produtores rurais. As plantações de cacaueiros em Sistemas Agroflorestais (SAFs) são uma excelente forma de produzir renda para pequenos agricultores que plantam cacau com outras variedades como açaí e banana, principalmente na região da Floresta Amazônica, bioma que a espécie Theobroma cacao é nativa e que sofre com o desmatamento causado principalmente pela agropecuária. Estudos mostram que o aumento de plantações de cacau está ajudando a reduzir o tamanho de áreas desmatadas, isso por que com a boa rentabilidade da produção de cacau, intensificada principalmente pela indústria de chocolate, os produtores rurais estão investindo nessa planta, aumentando seus hectares, alguns até estão trocando o pasto e as monoculturas por plantação de cacau, muitos em SAFs. Porém, o cultivo tradicional de cacau, com hectares e hectares apenas de cacaueiro, visando o abastecimento do mercado e lucro de grandes multinacionais, que infelizmente ainda é a maioria da produção de cacau ao redor do mundo, desencadeia problemas sociais como o trabalho escravo e trabalho infantil, não só no Brasil como nos outros países exportadores do produto. Os números de denúncia aumentam durante a páscoa, época de grande demanda. As grandes plantações de cacau eram comuns e estavam em alta no Brasil até meados da década de 1990, quando uma grande doença causada por um fungo conhecido como Vassoura de bruxa (Crinipellis perniciosa), dizimou boa parte das plantações no sul da Bahia, principal região produtora de cacau do país na época. Um dos motivos do fungo ter se espalhado tão rápido foi a falta de diversidade de espécies na plantação, proporcionada por esse tipo de cultivo, coisa que não acontece nos SAFs. Esse modelo de produção precisa ser combatido, e a população deve ter soberania na produção do cacau, que tem tido sucesso em sistemas agroflorestais. Um viés socioambiental muito importante do cacau está no seu cultivo e comercialização por várias comunidades de assentamentos. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário, existem 3,9 mil famílias que cultivam 17 mil hectares de lavouras cacaueiras, em sintonia com a floresta nativa, em SAFs, como principal obtenção de renda. É como mostra, por exemplo, um documentário produzido de forma independente, pelo fotógrafo Fellipe Abreu e a jornalista Patrícia Moll, que narra o processo de emancipação através da plantação de cacau pela comunidade de um assentamento em Dois Riachões (Assentamento Dois Riachões-CETA), no sul da Bahia. Dois Riachões - Cacau e Liberdade (Documentário). É importante darmos atenção a produtos com origem nesse tipo de produção, que além de serem feitos respeitando a floresta nativa, também a preserva, assim como a biodiversidade local e gera reanda a grupos mais vulnerabilizados socialmente, além de combater o trabalho infantil e trabalho escravo. O cacau é um exemplo de produto realmente sustentável. É nesse tipo de produção de alimento que os esforços devem ser direcionados. O cacaueiro é uma planta que além de fornecer um dos produtos mais gostosos que o ser humano já inventou, também carrega consigo uma rica história etnobotânica de ancestralidade e tem se tornado um aliado entre geração de renda e conservação da natureza, pois pode ser cultivado com a floresta nativa, sem a necessidade de degradar novas áreas e ainda com uma produção orgânica. Essa é só mais uma das maravilhosas plantas nativas que temos em nosso país. Referências https://ticotimes.net/2014/01/27/the-journey-of-cacao-from-bean-to-bar-in-photos https://www.em.com.br/app/noticia/agropecuario/2019/04/29/interna_agropecuario,1049672/minas-tambem-produz-cacau.shtml https://mst.org.br/2022/01/13/da-escravidao-a-independencia-familias-conquistam-renda-com-producao-agroecologica-de-cacau/ https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/71719295/estudo-mostra-expansao-sustentavel-do-cacau-na-amazonia https://www.brasildefato.com.br/2019/07/16/jovens-e-mulheres-frente-o-desafio-de-assumir-o-futuro-no-assentamento-terra-vista https://www.gov.br/incra/pt-br/assuntos/noticias/cacau-e-fonte-de-renda-e-preserva-o-meio-ambiente-em-assentamentos-da-bahia BATISTA, Ana Paula Sabbag Amaral. Chocolate: sua história e principais características. 2008. 56 f. Monografia (Especialização em Gastronomia e Saúde)-Universidade de Brasília, Brasília, 2008. Cuenca, Manuel Alberto Gutiérrez, Cristiano Campos NazárioImportância Econômica e Evolução da Cultura do Cacau no Brasil e na Região dos Tabuleiros Costeiros da Bahia entre 1990 e 2002. Aracaju: Embrapa Tabuleiros Costeiros, 2004. Doestert, N.; Roque, J.; Cano, A.; La Torre, M.; Weigend, M. (2012). Hoja botánica: Cacao (Theobroma cacao L.). Cooperación Alemana al Desarrollo – Agencia de la Giz, en el Perú. Lima. 159. Paleari, Lucia Maria. Um pão recheado de histórias – São Paulo : O Autor, 2021 ePub. Queiroga, Vicente de Paula, Cacau (Theobroma cacao, L.) orgânico sombreado: Tecnologias de plantio e produção da amêndoa fina. 1ed. / Organizadores, Vicente de Paula Queiroga, Josivanda Palmeira Gomes, Bruno Adelino de Melo, Esther Maria Barros de Albuquerque. – Campina Grande: AREPB, 386 f, 2021. Venturieri, A. , Oliveira, R. , Igawa, T. , Fernandes, K. , Adami, M. , Júnior, M. , Almeida, C. , Silva, L. , Cabral, A. , Pinto, J. , Menezes, A. and Sampaio, S. (2022) The Sustainable Expansion of the Cocoa Crop in the State of Pará and Its Contribution to Altered Areas Recovery and Fire Reduction. Journal of Geographic Information System, 14, 294-313. doi: 10.4236/jgis.2022.143016.

  • Por que não falamos sobre compostagem tanto quanto deveríamos?

    Há alguns meses eu decidi aproveitar um espaço no quintal da casa da minha mãe para finalmente fazer uma composteira. Sempre tive vontade de fazer uma e fui estudando aos poucos qual a melhor forma de fazer. Hoje uma amiga me mandou mensagem falando que a irmã dela quer construir uma também, e isso me deixou muito animado, pois, apesar do tema de compostagem ter se popularizado nos últimos anos, ainda é uma prática pouco conhecida pela maioria das pessoas e pouco ensinada nas escolas ou outros espaços de educação, portanto, pouco executada. A compostagem é uma das práticas mais antiga realizada pelo ser humano, com registro em civilizações da antiguidade como os egípcios, romanos, astecas e chineses. Nada mais é do que o processo de decomposição de restos de matéria orgânica provenientes de diversos tipos de atividades, como, por exemplo, restos de comida da nossa casa, tais como cascas de frutas e sobras das refeições. Toda essa matéria orgânica vai passar pelo processo de decomposição, feito pelos decompositores, fungos e bactérias. Além disso, esse é um processo que também ocorre na natureza sem intervenção humana, e é bastante importante para a saúde do solo nas florestas. Depois que comecei a estudar sobre o processo de compostagem e entender sua importância, passei a me questionar por que algo tão incrível não é tão popular. Muito se fala da reciclagem de produtos como plástico e metal, mas pouco se fala do que fazer com o que sobra de comida na nossa casa, nos restaurantes ou nas indústrias, por exemplo, esses resíduos orgânicos formam uma boa parcela do lixo total produzidos diariamente. Com a compostagem a gente consegue aproveitar esses restos. Sabemos que o processo de reciclagem de materiais como papel, plástico e metais, apesar de serem importantes, não conseguem dar conta do que é produzido todos os dias, ou seja, focamos em reciclar esses materiais, com campanhas de conscientização, mas não focamos em reduzir seu uso e produção e nem de diminuir a dependência dos mesmos. Mas, isso é tema de para um próximo post. Quando fungos e bactérias se alimentam dos restos orgânicos, eles geram o chamado adubo. O adubo é o produto da decomposição, rico em nutrientes que estavam presentes nos restos biológicos, tendo sido liberados pelos fungos e bactérias depois que os mesmos se "alimentaram" desses restos. A gente também tem a participação muito importante de um bicho que nem todo mundo gosta por achar nojento ou por medo: as minhocas. Elas também se alimentam de restos de matéria orgânica e ao defecarem liberam no solo uma excreta rica em nutrientes, formando o húmus. Além disso, as minhocas criam as chamadas galerias no solo que o torna mais aerado e melhora o fluxo de água e nutrientes na terra. A compostagem além de ser um importante processo para o meio ambiente é uma excelente ferramenta pedagógica que pode ser aplicada, não só em escolas, para demonstrar diversos temas na prática como, por exemplo, descarte e reaproveitamento de resíduos e saúde do solo, o papel dos decompositores, ou para falar das minhocas e seu filo Annelida. Podemos também focar no processo de funcionamento da compostagem, abordando temas como microbiologia, ciclo dos nutrientes e cadeias tróficas. Outra atividade que anda de mãos dadas com a compostagem e que serve como uma extensão dos seus conhecimentos é a criação de uma horta, seja nos espaços escolares ou comunitários. Eu considero que a junção da atividade de compostagem com hortas representa o ideal de metodologias para ensinarmos sobre reciclagem, reaproveitamento, soberania alimentar, cuidados com o solo e sustentabilidade. Mas, para a imensa maioria das escolas brasileiras e outros espaços de aprendizado, esse ideal ainda é utópico. Infelizmente a técnica de compostagem, mesmo presente no Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), e com tantos benefícios, ainda é pouco utilizada, seja por grandes empresas ou de forma caseira, por conta de uma série de fatores, como falta de investimentos e planejamento por parte do poder público, pois é um processo que demanda recursos e mão de obra caso seja feito em grande escala, e também por falta de educação ambiental para levar informações até as pessoas sobre o processo e como ele pode beneficiar a natureza, a sociedade e como elas podem participar ativamente disso. Há quem considere a ideia de mexer com o lixo algo sujo e desnecessário, gerando um certo bloqueio para falar sobre a técnica. É muito comum, por exemplo, as atividades de educação ambiental dentro das escolas serem voltadas a reciclagem de plástico, papel, metal e vidro, através do incentivo a coleta seletiva, mas pouco se aborda sobre a reciclagem dos orgânicos. O que chama a atenção é que a reciclagem de matéria orgânica pode ser feita em casa, sem a necessidade de grandes processos industriais, como o do vidro ou do plástico, por exemplo. Ou seja, a transformação do lixo orgânico produzido por nós é mais acessível e pode ser reciclado com menor custo, mas, ao mesmo tempo, pouco incentivada. A técnica de compostagem serve como uma alternativa para diminuir os impactos causados pela geração de resíduos orgânicos, pois se reciclarmos esses resíduos a gente evita que eles sejam jogados nos lixões e aterros sanitários. Então imagina só, se cada pessoa tiver sua composteira dentro de casa (e nem precisa ter um quintal, dá para fazer com baldes, por exemplo), ou cada mercado, restaurante e indústria construir sua composteira, menos lixo orgânico vai ser enviado para os lixões ou aterros, o tamanho dos aterros passa a diminuir e menos gás metano, proveniente da decomposição desse lixo, será lançado na atmosfera. Além disso, outro problema que a compostagem pode ajudar a diminuir é o desperdício de alimentos, que no Brasil chega a cerca de 25 toneladas por ano. Precisamos debater mais sobre a reciclagem de orgânicos, tanto quanto falamos da reciclagem de outros materiais. Ainda existe muita desinformação sobre a compostagem, então nós, professores e educadores ambientais precisamos trabalhar com nossos alunes e educandes, incluindo falar sobre tal prática nas nossas aulas e palestras, tornado-a mais comum, incentivando a população a ser protagonista no processo de sustentabilidade. Se você quer fazer uma composteira na sua casa para aprender na prática como que funciona, existem diversas formas e modelos, que não custam caro e não ocupam muito espaço. No meu caso eu aproveitei o espaço do quintal e fiz no chão mesmo. É interessante você fazer da maneira que melhor se encaixe na sua realidade, basta dar um Google e procurar sobre o processo e as diferentes formas de fazê-lo. De quebra, se você tiver plantas em casa, você pode utilizar o adubo nelas. O importante é aprender novas habilidades, mudar os hábitos e ser protagonista do processo de sustentabilidade e levar esse conhecimento adiante, incentivando a popularização da técnica. Referências CARVALHO, S; LIMA, N. Compostagem doméstica em Educação Ambiental: potencial de uma abordagem holística. Revista CAPTAR: Ciência e Ambiente para Todos, v. 2, n. 2, p. 40-54, 2010. ISSN 1647-323X. Disponível em: < http://hdl.handle.net/1822/10657 >. Acesso em 28 jan. 2015. Zago, V. C. P.; Barros, R. T. D. V. Gestão dos resíduos sólidos orgânicos urbanos no Brasil: do ordenamento jurídico à realidade. Eng. Sanit. Ambiental 2019, 24, 219– 228, DOI: 10.1590/s1413-41522019181376. Buss, A., & Moreto, C. (2019). A prática da compostagem como instrumento no ensino de conteúdos e na Educação Ambiental Crítica. Revista Monografias Ambientais, 18(1), e6. https://doi.org/10.5902/2236130839699.

  • A urgência de ensinarmos sobre racismo ambiental

    Foto da capa: https://br.noticias.yahoo.com Quando eu era pequeno, me pegava observando os lugares onde outras pessoas, com melhores condições financeiras, moravam. Era uma sensação de encantamento com os lares alheios. A grama do vizinho era sempre mais verde, mais confortável, maior e preservada. Às vezes também observava algum ambiente público de lazer com natureza preservada e achava tão chic. Era como um pequeno paraíso, um ambiente de paz onde eu podia ter um pouco de liberdade e entrar em contato com um ar mais puro, com plantas, animais e o silêncio. Só que esses lugares sempre pareciam ser distantes da minha casa, em outras cidades. Criado na periferia de Olinda, cresci olhando para o lugar que vivia como um espaço maltratado e injustiçado. Sempre pensava, “nossa, se a praia daqui tivesse mais infraestrutura, seria um espaço tão legal, a gente podia aproveitar tanto e não precisaríamos ir para outras praias mais longe! A prefeitura bem que podia organizar isso”. Olinda, a cidade onde nasci e cresci, infelizmente, não cuidava muito da preservação de suas praias e outros espaços públicos. Por muito anos, diversos esgotos, principalmente os de restaurantes de beira-mar, foram despejados na praia, e com o crescimento acelerado da população a poluição pelo lixo gerado pelas pessoas também aumentou. Cresci, e mudei-me para São Paulo, a cidade onde eu já não esperava ter acesso à natureza tão facilmente. Porém, mais do que ter dificuldade em achar espaços verdes na cidade, em São Paulo pude perceber outra coisa: a força da desigualdade social refletida no acesso a um meio ambiente preservado. Sabemos quão saturada é SP, com seus mais de 12 milhões de habitantes que se aglomeram nos saturados espaços urbanos. As áreas mais preservadas encontram-se afastadas tanto do centro como das periferias. Podemos achar alguns parques bem conservados e com bastante espaço na capital. Em São Paulo, um bairro considerado verde, ou seja, aquele que é mais arborizado, possui mais parques, praças, etc., é usado como fator de valoração imobiliária e torna-se mais caro, logo, está diretamente relacionado ao poder econômico. Quem tem mais dinheiro consegue morar e viver nesses locais mais verdes que vendem uma melhor qualidade de vida dentro da megalópole poluída. Então, algo que deveria ser um bem comum torna-se “moeda de troca” no mercado. Além disso, podemos falar também sobre infraestrutura urbana na cidade de São Paulo, onde periferia e centro tem um abismo enorme com relação a esse tema. O saneamento básico, a gestão de resíduos sólidos e acesso à água potável, são precarizados nas periferias, onde a maioria da população é constituída por pretos e pardos, o que é diferente das regiões em que maior parte da população é constituída por pessoas brancas. Só que isso não é exclusividade da capital paulista, mas uma infeliz realidade da grande maioria das cidades brasileiras. Eu não sabia como dar nome a todas essas diferenças que fui observando durante minha vida, seja em Olinda ou em São Paulo, e não sabia como e por que isso ocorria. Foi então que após adquirir alguns conhecimentos na minha graduação e após ler alguns posts nas redes sociais eu passei a entender que existe um termo para tal desigualdade: racismo ambiental, ou, injustiça ambiental. Origem e definição do termo O termo racismo ambiental nasceu nos Estados Unidos, cunhado pelo Dr. Benjamin Franklin Chavis Jr. A população negra estadunidense era a mais afetada pelos rejeitos das grandes indústrias, pois as regiões onde viviam eram o destino desses rejeitos tóxicos e poluentes, algo que não acontecia em áreas onde a maioria da população era formada por pessoas brancas. Pouco a pouco isso levou a população negra a se manifestar e denunciar como a degradação e poluição as acometiam com frequência e impediam de ter qualidade de vida. Em 1991 tema foi debatido na I Conferência Nacional de Lideranças Ambientais de Pessoas de Cor (First National People of Color Environmental Leadership Summit) onde passou a ter uma definição mais concisa. Segundo a declaração da Rede Brasileira de Justiça ambiental, racismo ambiental pode ser definido como “o mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto de vista econômico e social, destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento às populações de baixa renda, aos grupos sociais discriminados, aos povos étnicos tradicionais, aos bairros operários, às populações marginalizadas e vulneráveis.” Usando as palavras da pesquisadora Dra. Selene Herculano tiradas do seu artigo intitulado Racismo ambiental, o que é isso? De 2014, “a expressão suscita estranheza e há quem ache que teria sua dose de oportunismo e ‘apelação’. Mas olhe a cor da pele de quem mora nas favelas, sobre os morros, nas beira-rios e beira-trilhos; olhe a cor da pele de expressivo número dos corpos levados pelas enchentes, soterrados pelos deslizamentos.” De forma geral podemos definir o racismo ambiental como produto de injustiças sociais e consequentemente injustiças ambientais que recaem em grupos étnicos vulneráveis. Ou seja, é como se para a população pobre, preta e periférica sobrassem apenas áreas degradadas, e como se as áreas em que vivem importassem menos e estariam mais “receptivas” a receber os impactos e rejeitos de determinadas atividades, ou mesmo, não serem dignas de cuidado e preservação pelas autoridades públicas. Também ocorre quando populações de povos nativos e comunidades quilombolas, que em muitos processos de exploração e realização de mega obras, como a construção de usinas hidroelétricas, por exemplo, não são consideradas e precisam moldar suas vidas e se adaptar aos impactos causados pela perturbação no ambiente, o que pode levar a vários problemas, como a falta de comida e doenças. Criou-se uma ideia de que os efeitos das mudanças climáticas afetará todas as pessoas do planeta de forma igual, mas o racismo ambiental acontece para mostrar que não é bem assim, pois as consequências das atividades humana no planeta já causam diversos problemas que afetam de forma diferente as pessoas. Enquanto a população mais rica do planeta emite mais carbono e polui mais do que a população mais pobre, a primeira sofre menos com as consequências climáticas do que a segunda, que é duramente afetada. Esse termo exige uma reflexão ampla, pois é resultado de diversos outros problemas, como a colonização exploratória, distribuição de renda, moradia, urbanização e posse de terra. Exemplos reais do racismo ambiental A pandemia da COVID-19 é o maior exemplo do racismo ambiental no momento. Além de ser uma crise sanitária, a pandemia também pode ser considerada uma crise ambiental que surgiu da interação homem-animal, neste caso a caça e consumo de animais silvestres, que fez o vírus passar do animal para o homem. As maiores consequências da pandemia recaíram nas populações pobres e periféricas, em sua grande maioria pretas e pardas, além das populações de povos nativos, e podemos observar isso ao analisarmos as taxas de mortos pela Covid no mundo por áreas. E se precisarmos de exemplos mais antigos de racismo ambiental, podemos lembrar dos casos de Brumadinho e Mariana. Desastres ambientais causados por rompimento de barragens, construídas para conter o reservatório dos restos gerados pela atividade mineradora. Infelizmente, sabemos quais populações foram (e são) mais afetadas por esses desastres: comunidades locais, periféricas, povos nativos e quilombolas que tinham seu meio de subsistência por meio de atividades que dependiam dos rios, como a pesca, por exemplo. A importância do entendimento sobre o racismo ambiental no processo de educação ambiental Nós, profissionais da área ambiental, especialmente educadores ambientais e professores de ciências e biologia, precisamos sempre ter em mente que não é possível tratar de temas relacionados ao meio ambiente sem considerar os fatores sociais que afetam diretamente a vida das pessoas e consequentemente afetam a natureza. A crise ambiental existente é produto das desigualdades sociais fomentadas pelo sistema econômico em que vivemos. É preciso que debatamos com nossos alunes e educandes tais temas, pois, mais do que apenas entender sobre o meio ambiente, precisamos fazê-los entender nossa relação com o mesmo. Na educação básica, muito se fala da questão do lixo e o seu destino, mas pouco se questiona sobre quais pessoas são mais afetadas pelo acúmulo do mesmo. Os materiais didáticos incentivam a separação dos lixos recicláveis, mas não questionam se isso é algo possível para todas as pessoas fazerem. Em alguns bairros periféricos, por exemplo, não existe coleta seletiva, e em alguns casos, nem mesmo a coleta de lixo comum é realizada corretamente, devido à dificuldade de acesso às ruas. Ainda na questão do lixo, pouco se questiona sobre o acelerado consumismo que alimenta o capitalismo e gera mais e mais lixo todos os dias que serão jogados no planeta. Os impactos ambientais causados por atividades exploratórias como a mineração e a poluição por fábricas e indústrias são tratados de forma generalizada, como se esses impactos afetassem diretamente a todos da mesma forma. Não se debate sobre quais são as populações mais ou menos afetadas por tais impactos. Na verdade, pouco se fala da existência dos grupos minoritários e como vivem, como se relacionam com a natureza e entre si, fazendo parte do processo de apagamento étnico-racial contra esses grupos. Nos casos de enchentes e deslizamento por conta de chuvas, podemos nos deparar com discursos, da própria sociedade, que culpabiliza as pessoas por morarem em áreas de risco, mas muitas vezes não é questionado o porquê dessas pessoas morarem nessas áreas, ou por que não houve investimento por parte do poder público para prevenir tais desastres. O tema de racismo ambiental é perfeito para trabalhar multidisciplinaridade nas escolas e pode ser abordado envolvendo várias disciplinas como biologia, história, geografia, etc., porque exige uma compreensão ampla de alguns temas que nem sempre são debatidos nas aulas, como o entendimento do que é racismo e suas diferentes formas, pois, muitas vezes o ambiente escolar está preso a uma educação que apenas despeja os conteúdos nos alunos, visando a aprovação em vestibulares e processos seletivos, ou como diria Paulo Freire, uma educação bancária. Trazer esse tema cada vez mais para os debates possibilita o pensamento crítico necessário para salvarmos o meio ambiente, pois como eu disse no texto, a crise ambiental na qual nos encontramos é produto das desigualdades sociais geradas pelo capitalismo, então não vamos conseguir converter os danos causados e prevenir que novos aconteçam, sem entender as suas reais origens. Não é normal que alguns grupos estejam restritos a determinadas áreas. E não pode ser considerado normal que as periferias sejam negligenciadas quanto ao meio ambiente, quanto a infraestrutura e quanto a qualidade de vida. Também não é justo que algumas áreas onde alguns grupos vivem, sejam uma opção para qualquer tipo de descarte, sem que haja preocupação com as vidas ali presentes. E é inconcebível que para ter acesso e estar inserido em áreas que ofereçam um bem-estar ecológico, as pessoas devam pagar para tal. Para finalizar o texto gostaria de reforçar o artigo 225 da constituição brasileira de 1988 que diz: todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Referências HERCULANO, S. Racismo ambiental, o que é isso? Rio de Janeiro: Universidade Federal Fluminense, 2014. Angeli, T., & Oliveira, R. R. (2016). A utilização do conceito de Racismo Ambiental, a partir da perspectiva do lixo urbano, para apropriação crítica no processo educativo ambiental. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, 33(2), 51-70. Pereira, Viviane Camejo, and Claudemira Vieira Gusmão Lopes. "o ecologismo dos pobres e o racismo ambiental: reflexões sobre sociedade e natureza para uma educação ambiental crítica." Divers@! 14.2 (2021): 110-125. https://jornal.usp.br/atualidades/racismo-ambiental-e-uma-realidade-que-atinge-populacoes-vulnerabilizadas/. https://polis.org.br/estudos/racismo-ambiental/. https://antigo.mma.gov.br/educacao-ambiental/pol%C3%ADtica-nacional-de-educa%C3%A7%C3%A3o-ambiental/documentos-referenciais/item/8077-manifesto-de-lan%C3%A7amento-da-rede-brasileira-de-justi%C3%A7a-ambiental.html. https://arvoreagua.org/crise-climatica/racismo-ambiental.

  • Alfavaca: a poderosa prima não tão famosa do manjericão

    “Que as letras tragam o equilíbrio da Laranjeira e da Alfavaca de Oxum e levem o mal como o Jambuaçu! Que as letras nos deixem respirar como o Alecrim de Oxalá!” Esse é um trecho de um poema que retirei da revista África e Africanidades que traz consigo algumas plantas de importância cultural para o candomblé, dentre elas está a alfavaca, que será a protagonista do post botânico de hoje. Mas antes quero falar um pouco da minha relação de longa data com essa planta. A alfavaca marcou bastante a minha infância e quando se trata de planta que desperta a minha memória olfativa, com certeza o seu cheiro é a primeira coisa que me vem a cabeça. É só passar perto de uma e sentir o cheiro, que lembro lá do quintal da minha avó em Olinda, lembro de pegar as suas inflorescências em espiga e debulhar os pequenos frutos de cada uma delas para comer como se fosse um petisco, lembro das dores de barriga curadas com seu chá que era a primeira coisa que minha avó mandava fazer quando alguém dizia estar com dor de barriga. No quintal da minha avó tinha várias alfavacas, que eram o remédio caseiro mais utilizado pela família quando se tratava de problemas gastrointestinais. E era só fazer o chá umas 3 ou 4 vezes que você ficava bom. Isso não era atoa, pois a alfavaca tem sim propriedades medicinais, comprovadas cientificamente. Para minha surpresa, quando me mudei para São Paulo, para morar com os meus pais, descobri que no quintalzão da casa que eles alugaram tinha alguns pés de alfavaca. Novamente me deparei com aquela planta, mas naquela época eu não dei o seu devido valor, já que achava uma planta comum e não entendia muito sobre plantas medicinais, pois ainda não tinha começado a minha formação de biólogo, logo não tinha estudado sobre elas. Pois bem, alguns anos depois eu comecei a sentir dores na região do estômago e eu desconfiava que essas dores eram resultados de alguma parasitose, tipo ameba, giárdia, lombriga, etc., adquiridas em algum trabalho de campo que fiz durante o mestrado ou em alguma viagem a passeio que fiz durante minhas férias. Então, mesmo sem ir ao médico ou fazer algum exame, fiz a coisa mais imprudente, porém a mais prática na correria do dia a dia e na dificuldade de conseguir uma consulta no SUS: eu me automediquei com o famigerado, Anita. Felizmente a dor foi passando, eu achei que tinha me livrado de qualquer parasita que tivesse se instalado no meu corpo. Alguns meses depois, as dores voltaram, com menos intensidade, mas bastante incômodas. Portanto, não se tratava de parasitose. Fui procurar uma consulta no SUS para saber o que realmente era. Nesse tempo de espera as minhas dores iam e voltavam e o que entendi era diretamente relacionada ao meu emocional. Bom, se vamos falar de estresse, eu queria dizer que fui professor da rede estadual de São Paulo por mais de 1 ano, trabalhando com adolescentes de 15 aos 18 anos, com isso dá para saber que os padrões de estresse eram altos no meu dia a dia (rs). É comprovado que estresse e ansiedade geram alterações fisiológicas no nosso corpo, aumentando a produção de hormônios como adrenalina e cortisol, que podem afetar diretamente o nosso sistema gastrointestinal, fazendo com que o estômago, por exemplo, libere mais suco gástrico, que em excesso afeta a sua mucosa e isso cria o ambiente perfeito para o desenvolvimento de algumas doenças. Meses depois consegui fazer a endoscopia que acusou a presença da bactéria Helicobacter pylori, a famosa H. pylori. Devido às condições ideais causadas pelo estresse e ansiedade do dia a dia e pela minha alimentação que não era das melhores, mesmo eu me cuidando para comer bem, a H. pylori causou uma gastrite em mim. Há alguns dias eu fui ao médico e finalmente consegui a medicação para fazer o tratamento e eliminar a bactéria do meu corpo. Nesse tempo que tive várias dores eu não morava com os meus pais, já estava morando com o meu namorado em outro bairro distante da casa da minha mãe que morava no extremo da ZL e eu na ZS de São Paulo. Quando conversava com a minha mãe, ela sempre me falava para tomar chá de alfavaca. Mas infelizmente não é uma planta tão comum como eu achava e por onde moro não encontrei em lojas de produtos naturais. Então, tive que tomar remédios para aliviar a dor. Nas últimas vezes que fui à casa da minha mãe voltei a sentir dor e finalmente pude fazer o chá de alfavaca que foi o melhor remédio de todos, capaz de aliviar a minha gastrite mais rápido do que comprimidos, e de uma hora para outra eu estava viciado em chá de alfavaca. Fiz esse post botânico para enaltecer e divulgar essa planta, que apesar de não ser nativa do nosso país é bastante popular por aqui, mas, ao mesmo tempo, desconhecida por muitos, sendo bastante utilizada para diversos fins medicinais pelo seu alto potencial terapêutico. Nome científico, origem e distribuição A alfavaca, também conhecida como alfavacão, quioiô, alfavaca-cravo ou alfavaca-branca (dependendo da região que você vive) recebe o nome científico de Ocimum gratissimum L., e pertence à família botânica das Lamiaceae que é a mesma família da hortelã, do manjericão e do orégano. Como eu disse, não é uma espécie nativa, ou seja, não corria naturalmente no nosso território, ela foi introduzida, é uma planta exótica que foi naturalizada devido ao seu uso intenso no país e sua adaptação as condições climáticas. Ela é originária da Índia e do oeste africano, tendo sido trazida para o Brasil pelos povos africanos escravizados. Atualmente é bem difundida na África, Ásia, nas Américas tropicais e em alguns países europeus. No Brasil, tem ocorrência confirmada em diversos estados e em todas as regiões do país. Características botânicas Fazendo uma breve descrição, a alfavaca é um subarbusto perene, aromático, ereto, anual, de 1 a 3 m de altura, caule ereto, muito ramificado, pubescente (quando jovem), lenhoso (quando adulta); folhas opostas, ovalado-lanceoladas, delgada, pubescente, membranáceas, com bordos denteados, de 4 a 10 cm de comprimento, com pecíolos de 2 a 4,5 cm de comprimento; flores pequenas, roxo-pálidas, dispostas em racemos paniculados curtos e agrupados; fruto do tipo aquênio, com 4 sementes (tetraquênio); as sementes são pequenas, oblongas e de coloração preta. A alfavaca possui um cheiro bem característico, pois é uma planta aromática. Morfologicamente ela é bem parecida com sua prima manjericão, que também tem aquele cheiro bem característico que lembra pizza de marguerita e molho de macarrão, só que o cheiro da alfavaca é mais parecido com o cheiro adocicado do cravo-da-índia e por isso que em alguns lugares ela recebe o nome de alfavaca-cravo. Essa característica ajuda a distinguir as primas sem nem mesmo olhar outras características como a diferença nas folhas, por exemplo, as da alfavaca são lanceoladas a elípticas, com ápice atenuado, já as do manjericão são elípticas a ovais com ápice redondo a agudo. Há quem ache que as duas plantas são uma só. Eu particularmente acho suas flores e frutos uma graça e adorava comê-los, na verdade, faço isso até hoje. O cálice e a corola da flor, partes constituídas pelas pétalas e sépalas, possui um formato semitubular, o que me lembra um sininho. As flores são polinizadas por vários tipos de insetos, desde abelhas, moscas, formigas e vespas. Potenciais terapêuticos e uso medicinal As folhas, flores, frutos, sementes, caules jovens e raízes da alfavaca podem ser usadas para fazer chás, óleos ou até mesmo como tempero na comida, devido ao seu grande potencial terapêutico. Ocimum gratissimum é uma planta rica em óleos essenciais, assim como outras plantas da família a qual pertence. Óleos essenciais são substâncias químicas encontradas nos vegetais que pertencem ao grupo dos metabólitos secundários, que são substâncias responsáveis pela defesa da planta contra herbívoros, contra microrganismos patogênicos, como fungos e bactérias, contra alguma adversidade do clima que cause algum estresse na planta ou mesmo para atrair polinizadores. A maioria desses óleos essenciais são aromáticos e liberam um cheiro característico, e, por isso, plantas como o manjericão, hortelã, e a alfavaca, são tão cheirosas. Há registro de várias utilidades da alfavaca na medicina popular, servindo para doenças que atacam o trato respiratório como tosse e congestão nasal, problemas no trato digestivo como dores estomacais, enjoos e diarreia, problemas de pele, cólicas menstruais, ansiedade, entre outros. Na literatura científica temos vários estudos que comprovam a eficácia da alfavaca, vou deixar alguns, nas referências. As plantas com potencial medicinal são usadas pelo ser humano há muito tempo, desde a pré-história, passando por sociedades da antiguidade como egípcios, mesopotâmios, gregos, romanos, entre outros, até as sociedades atuais. Para muitos povos tradicionais, essas plantas ainda são a principal fonte de tratamento para várias enfermidades, isso por que eles também estabelecem uma relação espiritual com a natureza e fazer o uso de plantas medicinais é parte da sua cultura. Os remédios feitos a base de planta recebem o nome de fitoterápicos, e movimentam uma boa parcela da economia brasileira, gerando renda para diversos agricultores que vendem essas plantas. O nosso país tem uma das populações que mais faz uso desse tipo de remédio no mundo, costume que herdamos de nossos ancestrais africanos e dos povos originários. A medicina popular pelos fitoterápicos é uma alternativa para diversas pessoas, com dificuldade em ter acesso ao Sistema Único de Saúde, não possuem renda suficiente para gastar com medicamentos ou mesmo pela tradição e costumes enraizados a gerações nas famílias. Porém, é preciso ter cautela, hein? Algumas plantas ainda precisam de mais testes para saber quais são seus constituintes químicos e verificar sua eficácia. O uso indiscriminado de algumas espécies pode ser ruim para o nosso corpo. Além disso, é importante também ir ao médico, pois a medicina popular e a medicina convencional podem ser grandes aliadas no tratamento de doenças. No meu caso, por exemplo, a alfavaca está diretamente relacionada aos costumes da minha família, que foi passado pela minha avó e hoje é passado pelas minhas tias, minha mãe e agora, por mim, pois eu só tenho que enaltecer essa planta por acalmar várias vezes a minha gastrite. Eu já estou fazendo a minha mudinha para tê-la na minha casa, com as minhas outras filhas. E é incrível como uma planta pode ser tão emblemática na nossa vida, né? Essa foi uma planta que esteve comigo antes mesmo de eu nascer, com os meus ancestrais, na infância até a vida adulta, e sempre que precisei ela estava lá para me ajudar com os meus problemas de saúde. E vocês, qual ou quais plantas te despertam a memória olfativa? Vocês têm costume de usar algumas para tratar alguma coisa? Me diz nos comentários. Referências Mulheres das Ervas: antologia de contos, crônicas e poemas / Organização : Nágila Oliveira dos Santos Quissamã: Revista África e Africanidades, 2021. PEREIRA, C.A.M.; MAIA, J.F. Estudo da atividade antioxidante do extrato e do óleo essencial obtidos das folhas de alfavaca (Ocimum gratissimum L.). Ciência e Tecnologia de Alimentos, v.27, n.3, p.624-32, 2007. https://fitoterapiabrasil.com.br/planta-medicinal/ocimum-gratissimum. Antar, G.M. Ocimum in Flora e Funga do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro.Disponível em: . Acesso em: 10 jan. 2023. SILVA, L.L. Composição química e atividades biológicas de Ocimum gratissimum L. Dissertação (mestrado em farmacologia), Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2009. http://sossegodaflora.blogspot.com/2021/02/alimentos-tradicionais-na-diaspora-afro.html. BRASIL, Ministério da Saúde. Monografia da espécie Ocimum gratissimum L. (alfavaca). Brasília, 2015.

  • As críticas ambientais por trás de Avatar

    "As pessoas dizem que vivemos em Eywa, Eywa vive em nós." Semana passada eu fui assistir Avatar 2: caminho das águas, e deixando de lado o fato de o filme ter um roteiro bobo e sustentar os espectadores com visuais incríveis e cenas de ação clichê em mais de 3 horas, pois essa é só minha opinião de cinéfilo rs, eu queria destacar algumas questões ambientais levantadas pelo mesmo. Não é novidade que Avatar é baseado em grande parte na história da relação humana com a natureza. O próprio diretor é envolvido em causas ambientais. Mas, devido a tantas referências com o mundo real e pelo “curto” tempo para abordar essas questões no filme, muita coisa pode passar despercebida ou podemos não entender as verdadeiras questões ambientais que inspiraram algumas cenas dos dois filmes da franquia, ou mesmo não saber o que é uma referência real e o que é fictício. Então decidi escrever esse texto, de forma resumida, tentando debater sobre alguns desses pontos e fazer algumas comparações com o mundo real e a atual situação ambiental do nosso planeta. Ah, o texto pode conter spoiler. Colonização e desmatamento: O enredo principal dos filmes de Avatar é a colonização do planeta Pandora pelos seres humanos e as relações com a biodiversidade local e os povos nativos, o povo Na’vi. O Homo sapiens destruiu o seu planeta devido ao seu modo vida nada sustentável, baseado pelo consumo e exploração dos recursos naturais da terra e está em busca de um novo planeta para colonizar. Sabemos em qual momento da história da humanidade esse enredo se baseia, certo? Nas colonizações das Américas, do continente africano, asiático e a Oceania pelos europeus. Como o assunto é bem amplo, vamos falar sobre isso analisando a situação do nosso país. Um dos biomas que mais sofreu com a invasão dos povos europeus foi a mata atlântica. Fala-se muito sobre o desmatamento da Amazônia e o genocídio dos povos nativos que habitam essa área, então outros biomas acabam caindo no esquecimento, como na Mata atlântica e no Cerrado que também sofrem bastante com perda de áreas. A Mata atlântica é o bioma que sofre a mais de 500 anos, pois foi o primeiro bioma que os portugueses pisaram no Brasil. Desde o período da colonização até o momento atual, o bioma não teve paz. São vários animais em risco de extinção, animais esses que só ocorrem nesse bioma e recebem o nome de endêmicos, como o Mico-leão-dourado, os Muriquis e o tucano-pacova, por exemplo. Desde o "descobrimento" do nosso país esses animais perdem espaço de floresta para atividades como agricultura e pecuária, por exemplo, ou para a intensa urbanização. Hoje o bioma está restrito a cerca de 8% do território brasileiro. Assim como o povo Na’vi viu suas florestas sendo destruídas pelo povo do céu quando esses decidiram colonizar Pandora, o mesmo ocorreu com os povos nativos brasileiros da Mata Atlântica, que foram os primeiros a terem contato com o homem branco e verem suas florestas serem devastadas, para extrair madeira, pau-brasil principalmente, e ter o seu povo escravizado e dizimado. No caso de biomas como o Cerrado, o processo ocorreu de forma mais lenta, já que o nosso país tem um território amplo, e para acessar esse bioma os colonizadores, no caso os bandeirantes, tiveram que adentrar o interior do país em busca de minérios como o ouro, por exemplo, desmatando a vegetação, escravizando e matando os povos nativos. Essa tem sido a lógica da colonização durante todos esses anos, não só no nosso país, mas ao redor do mundo: invasão, genocídio de povos nativos, desmatamento e exploração de matéria-prima para abastecimento do consumo e o enriquecimento de poucos. Nesse processo a gente tem grande perda da biodiversidade, animais, plantas, fungos, etc., principalmente pela diminuição dos seus habitats que são a sua “casa”. No filme a gente consegue ver os bichos correndo, desesperados quando a floresta vai sendo devastada, é dessa forma que acontece no mundo real também. Caça predatória e poder bélico Esse tema foi mais abordado no segundo filme, onde o autor mostra o grande potencial bélico do povo da terra com os diversos novos tipos de armas, robôs e IA, construídos no intuito de enfrentar não só o povo Na’vi como a própria natureza de Pandora, incluindo a caça predatória dos animais do planeta. O animal do filme duramente caçado é um tipo que se assemelha às baleias do nosso planeta, os chamados Tulkun. Esses animais são dotados de uma grande capacidade cognitiva, seres muito inteligentes, sensíveis e espirituais, mais do que várias espécies, incluindo o Homo sapiens. No filme os Tulkun possuem um líquido dourado no cérebro muito raro e extremamente valioso para os seres humanos, conhecido como ‘Armita’, capaz de retardar o envelhecimento. Tal líquido só pode ser extraído com a morte do Tulkun. Falando dos animais que inspiraram James Cameron na construção do Tulkun, as baleias foram um dos seres vivos que mais sofreram nas mãos dos seres humanos, e essa analogia retratada no filme é um ponto alto da história, pois assim como os Tulkuns as baleias foram caçadas, com arpões, para extrair principalmente o seu óleo que era usado como um tipo de combustível para iluminação de ruas. A caça de baleias é algo que acontece há muito tempo nas populações humanas, para obter carne e combustível, mas foi entre o século XVII e XIX que a caça se tornou predatória. Nesse período as armas para matar as baleias foram se “aperfeiçoando” com o avanço tecnológico da sociedade, assim como acontece no filme. Existiram até arpões com explosivos na ponta. Na época, toda essa caça era legalizada e as pessoas faziam isso em nome do progresso da humanidade, chegava a ser algo até esportivo. Como consequência disso, os pesquisadores estimam que entre 2 a 3 milhões de baleias morreram ao longo desses anos em todo o mundo. E isso se reflete até os dias atuais, pois muitas espécies como a baleia-azul, a baleia-franca do norte e a baleia cinza ainda podem desaparecer da natureza, ou seja, de serem extintas. O ciclo reprodutivo desses cetáceos é lento, isso faz com o número de indivíduos leve mais tempo para aumentar. As baleias possuem importantes papeis no ecossistema marinho, pois são predadores topo de cadeia, se alimentando de uma vasta quantidade de seres vivos, mantendo essas populações controladas nas teias alimentares, além de suas fezes servirem como adubo orgânico no oceano, ajudando na manutenção do ciclo dos nutrientes como carbono, nitrogênio e ferro. Atualmente a caça de baleias é proibida, só que isso não quer dizer que ela deixou de existir. Mas, os maiores problemas que esses mamíferos tem que enfrentar atualmente, estão relacionados ao aquecimento global e poluição dos mares, consequências das ações do ser humano no planeta, que diminuem a disponibilidade dos alimentos no mar e tornam diversos animais doentes, contaminados por microplásticos, afetando as baleias. Esse é um dos temas mais importantes do filme, trazendo ao spotlight uma crítica bem referenciada sobre a caça, especialmente das baleias, e a evolução do poder bélico no processo de colonização humana. Sustentabilidade e hipótese de Gaia Quando o primeiro filme de Avatar surgiu nos cinemas, em 2009, a sétima arte não costumava fazer filmes com temáticas ambientais, principalmente para blockbusters. Então, naquele ano, o mundo experimentou uma imersão de tecnologia 3D costurada com um enredo que criticava o modelo de exploração dos recursos naturais pelos seres humanos e apresentava em contraponto o mundo de Pandora, onde os nativos existiam em sintonia com a natureza, que é uma divindade conhecida como Eywa. Tudo que os nativos precisam para existir é provido pela grande mãe, que é viva e atua como um tipo de consciência, conectada a tudo e a todos. Na década de 1970 um biólogo chamado James Lovelock, propôs uma hipótese que falava basicamente o mesmo que vemos em Pandora, só que nesse caso, para o nosso planeta. Em sua hipótese ele dizia que a terra atua como um tipo de organismo vivo que regula as condições atmosféricas como quantidade e tipos de gases, luz, e nutrientes, permitindo a manutenção da vida no nosso planeta, e que um sistema depende do outro para funcionar. A hipótese não foi aceita por diversos cientistas. Não vou falar nesse post sobre a veracidade dessa hipótese, talvez em outro momento. Mas o que chama a atenção aqui é a diferença da percepção da natureza e o modo de vida dos seres humanos e dos Na’vi. Enquanto os nativos consideram a natureza do seu planeta como uma entidade sagrada, mantendo seu modo de vida sustentável em respeito a Eywa, preservando e conservando todos os ciclos dela, os seres humanos, que não consideraram a natureza do seu planeta viva e não possuíam conexão espiritual com a mesma, não viram problemas em explorar os seus recursos de forma descontrolada e sem se preocupar com as consequências para a manutenção da mesma, levando falência dos seus recursos naturais. Partindo para uma percepção científica, o nosso planeta possui sim um integrado sistema de autorregulação que está sendo afetado pelas atividades humanas, que desregulam ciclos, alteram paisagens e o modo de vida de diversos seres vivos, os quais passaram anos e anos se adaptando às condições naturais da terra pelo processo evolutivo. Atividades como a mineração, por exemplo, levam a poluição dos rios, despejando grandes quantidades de metais pesados no ecossistema, como o mercúrio e chumbo, gerando a morte e adoecimento dos animais e consequentemente diminui a biodiversidade do local e a disponibilidade de peixes para as populações que vivem da pesca. O modo de vida do povo Na’vi atua como uma forma de criticar o estilo de vida da humanidade e também de propor uma reflexão sobre a nossa conexão com o mundo natural. E fica o questionamento, será que é possível vivermos como aqueles alienígenas do filme? Bom, ao menos deveríamos. O planeta terra fornece os chamados serviços ecossistêmicos. Tais serviços podem ser provenientes da interação dos seres vivos com a natureza, como, por exemplo, a polinização, o sequestro de carbono, adubação, produção de alimentos e remédios, ou por fenômenos naturais da atmosfera, como as chuvas, os ventos, os raios solares, etc. Todos esses serviços podem ser convertidos para nosso bem, para a nossa existência, sem ser necessário a depredação dos mesmos. Por exemplo, a produção de energia solar e eólica, a produção de alimento pelos sistemas agroflorestais, o ecoturismo, entre outros. Nesse sentido, os filmes de James Cameron nos fazem refletir não só sobre como nos relacionamos com o meio ambiente, como nos faz refletir sobre o nosso modo de vida, sobre quais são as nossas necessidades e o que fazemos para obtê-las e como nosso avanço tecnológico é usado para alimentar esses desejos, pois fica claro a dicotomia entre sobrevivência e tecnologia. A ecologia não é um empecilho para o desenvolvimento e não é oposta ao progresso. É possível vivermos em um mundo assim como o de Pandora, com desenvolvimento sustentável, que respeite e priorize a natureza e seus ciclos, diminuindo o progresso material e acumulação de riquezas, focando no sustentável. Então, o que precisamos é de uma mudança nas prioridades, principalmente do nosso sistema econômico. Bom, certamente Avatar é uma grande obra do cinema moderno, apesar de ter uma trama bem clichê de heróis e vilões, não só pela qualidade visual dos filmes, com uma tecnologia inovadora que inspirou toda uma geração cinematográfica após o seu lançamento, mas também pelas críticas a humanidade e seu modo de vida e por seu carregado enredo ambientalista, que, novamente, na minha humilde opinião, deixa a desejar nesse segundo filme, onde alguns temas são explorados de forma rasa. De qualquer forma, são ótimos filmes que podem ser grandes aliados na causa ambiental, despertando, principalmente em crianças e adolescentes, reflexões e questionamentos através do encantamento, servindo inclusive para serem abordados em sala de aula para debater sobre conscientização ambiental. E se vocês conseguem destacar algum outro ponto interessante do filme que eu não abordei no texto, deixa aí nos comentários, e falem também o que acharam desse segundo filme. Referências https://www.nationalgeographicbrasil.com/natgeo-ilustra/mata-atlantica#:~:text=Devastada%20%C3%A0%20exaust%C3%A3o%20desde%20o,elas%20o%20pr%C3%B3prio%20pau%2Dbrasil. https://www.queroverbaleia.com/single-post/a-historia-da-caca-as-baleias#:~:text=A%20explora%C3%A7%C3%A3o%20dos%20grandes%20mam%C3%ADferos,de%20Janeiro%20e%20Santa%20Catarina. https://marsemfim.com.br/caca-as-baleias-aprenderemos-com-a-historia/ Luis Nogueira Matias, J., & Mariana Aires Oliveira, C. (2017). Santuário e a proteção das baleias: caça predatória e a preservação ambiental. Revista Brasileira De Direito Animal, 12(03). https://www.bioicos.org.br/post/importancia-das-baleias-para-o-ecossistema-marinho. Zanoni Constant Carneiro Leão, I., & Maia, D. M. (2010). A Teoria de Gaia. Economia & Tecnologia, 6(21).

  • Olha o verão, hein!

    “Vamos manter a praia limpa, jogando o lixo no saquinho! Praia limpa é cidadania, praia limpa é mais prazer, praia limpa é mais saúde, Depende de mim, depende de você!” Esse é talvez um dos maiores jingle de campanha que eu me lembro, algo que marcou a minha vida e de vários recifenses. A música foi feita cerca de 20 anos atrás, pela prefeitura do Recife em parceria com a Rede Globo, para promover a conscientização da população sobre a quantidade de lixo deixada nas praias recifenses. Todo ano é o mesmo: o verão chega, as festas de final de ano começam, as pessoas entram de férias e tudo acaba em um único lugar: a praia. E todo ano, especialmente nessa época, temos que reforçar a importância de ser responsável pelo seu lixo quando utilizar esse espaço público natural. O fervor nas praias é super compreensível, já que, começa aquele calorão de final de ano, típico do verão e nada melhor do que se refrescar numa prainha. O que não é compreensível, mas infelizmente muito comum, é a quantidade de lixo deixada nas praias pelas pessoas. A maioria desses lixos é composta por itens feitos de plástico, como garrafas, canudos, embalagens de sorvete e copos descartáveis, provenientes do nosso consumo. O lixo encontrado no mar também pode ser trazido através de rios que cortam as cidades e que desembocam nos oceanos. Pois é, rios e oceanos estão conectados, aquele córrego poluído na avenida perto da sua casa em algum momento pode acabar lá na praia que você vai passar suas férias. Então a responsabilidade com o seu lixo não é apenas no momento de lazer lá na praia, começa também no seu bairro. Mas devemos saber que o poder público também tem a sua responsabilidade na gestão dos resíduos nas cidades, grande parte da responsabilidade, eu diria. Falando do momento da praia, muita gente acha que está tudo bem em enterrar o lixo na areia, ou só jogar lá mesmo que o mar leva. Nem precisa dizer o quanto isso é errado (e feio), né? A praia é um espaço que está em conexão com o mar e com os animais que vivem e dependem dele para existir. É o movimento das ondas com o acúmulo de sedimentos, em geral, arenosos, que atua na formação da praia. Tudo que está na areia pode chegar ao mar. Muitos desses lixos permanecem durante anos na natureza e afetam diretamente animais marinhos que os confundem com comida, ou às vezes ficam simplesmente presos em algumas partes do corpo do animal. O plástico, por exemplo, é o terror dos animais marinhos. Como vocês já devem saber a essa altura do discurso ambiental, o plástico é um desses materiais que mais demora para se degradar na natureza, de 20 a 400 anos, dependendo do tipo de plástico que estivermos falando. Além de demorar a se decompor com o tempo, ele se deteriora em pequenos pedaços, e é aí que mora o perigo. O chamado microplástico é apontado como o principal vilão proveniente do descarte errado do plástico nos ecossistemas, principalmente o marinho. O plástico vai se degradando, e se transformando em pedaços pequenos e esses pedaços por sua vez são ingeridos por zooplanctons e outros animais e vão se acumulando no corpo dos seres vivos, deixando-os doentes, e vai seguindo pelas teias alimentares, podendo chegar até nós, seres humanos. Então, sim, o lixo da praia pode acabar voltando para sua alimentação através dos microplásticos. Recentemente circulou pelas redes sociais um vídeo de uma orca que se aproxima de um barco de pescadores e esses fazem a maior festa e tocam no animal (nunca façam isso). Um tempo depois descobriu-se que essa mesma orca foi encontrada morta com uma abundância de plástico dentro do seu sistema digestivo. Provavelmente a orca estava procurando por ajuda e por isso se aproximou do barco. Se procurarmos no Google imagens dos efeitos do plástico na fauna marinha, infelizmente vamos achar vários casos como o dessa orca, ou até piores. Nessa época do ano é importante você e sua família, toda vez que forem a praia, levar um saquinho de lixo e ao sair de lá, depositar esse lixo em uma lixeira. Tem praias que inclusive possuem lixeiras para separar os lixos recicláveis por cor (papel, plástico, vidro e metal). Não dá para enterrar na areia ou deixar que o mar leve embora. O ideal mesmo seria que não usássemos plástico ou que reduzíssemos bem muito o seu uso, mas vivemos em um sistema que incentiva o consumo, e os materiais como plásticos e latas de alumínio, por exemplo, são materiais que servem essa lógica de produção desenfreada e intensa que alimenta o capitalismo, por isso que são usados em grande escala. Precisamos mudar nossos hábitos de consumo, reduzindo-os e reutilizando materiais, essa é a verdadeira raiz do problema. Infelizmente a reciclagem acaba não conseguindo acompanhar a produção e descarte dos mesmos e uma grande quantidade vai parar na natureza devido ao descarte incorreto. Então, nos resta diminuir os nossos impactos, evitando que o lixo chegue em um animal que não tem nada a ver conosco, jogando-o no lugar correto de descarte e incentivando outras pessoas a fazer o mesmo, não só na praia como no nosso dia a dia. A conscientização ambiental da população é a maior aliada da natureza. É através da mobilização da comunidade que podemos melhorar a preocupante situação ambiental que nos encontramos. Outra coisa que podemos fazer é atuar em projetos voluntários para a limpeza das praias em mutirões, como o próprio projeto Praia Limpa da prefeitura do Recife. Existem vários espalhados pelo país, com a participação de diversas ONGs. Se você mora em uma cidade litorânea ou está passando férias em alguma, caso tenha tempo, seria bom conhecer os projetos dessa região para ajudar na conservação do ecossistema marinho local. Na hora de curtir a prainha de verão, lembre de ser responsável pelo seu lixo e jogá-lo no lugar certo, na lixeira. Como diria um dos mais famosos jingles recifenses “Vamos manter a praia limpa, jogando o lixo no saquinho.” E se você conhece algum desses projetos voltados para a limpeza das praias, ou mesmo se você participa, na sua cidade, me fala nos comentários para eu conhecer! Precisamos divulgar tais iniciativas. Referências Leon, L. L., Bertolucci, J. B., de Souza, A. S., de Goes, A. Q., Balthazar-Silva, D., & Rocha-Lima, A. B. C. (2020). Poluição dos ecossistemas marinhos brasileiros: uma breve revisão sobre as principais fontes de impacto e a importância do monitoramento ambiental. Unisanta BioScience, 9(3), 166-173. https://escolaverde.org/site/?p=70289 https://www.ecycle.com.br/microplastico/

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