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Alfavaca: a poderosa prima não tão famosa do manjericão

  • Foto do escritor: Eduardo Muniz
    Eduardo Muniz
  • 10 de jan. de 2023
  • 7 min de leitura

Atualizado: 4 de abr. de 2023

Que as letras tragam o equilíbrio da Laranjeira e da Alfavaca de Oxum e levem o mal como o Jambuaçu! Que as letras nos deixem respirar como o Alecrim de Oxalá!”


Esse é um trecho de um poema que retirei da revista África e Africanidades que traz consigo algumas plantas de importância cultural para o candomblé, dentre elas está a alfavaca, que será a protagonista do post botânico de hoje. Mas antes quero falar um pouco da minha relação de longa data com essa planta.


A alfavaca marcou bastante a minha infância e quando se trata de planta que desperta a minha memória olfativa, com certeza o seu cheiro é a primeira coisa que me vem a cabeça. É só passar perto de uma e sentir o cheiro, que lembro lá do quintal da minha avó em Olinda, lembro de pegar as suas inflorescências em espiga e debulhar os pequenos frutos de cada uma delas para comer como se fosse um petisco, lembro das dores de barriga curadas com seu chá que era a primeira coisa que minha avó mandava fazer quando alguém dizia estar com dor de barriga.


No quintal da minha avó tinha várias alfavacas, que eram o remédio caseiro mais utilizado pela família quando se tratava de problemas gastrointestinais. E era só fazer o chá umas 3 ou 4 vezes que você ficava bom. Isso não era atoa, pois a alfavaca tem sim propriedades medicinais, comprovadas cientificamente.


Para minha surpresa, quando me mudei para São Paulo, para morar com os meus pais, descobri que no quintalzão da casa que eles alugaram tinha alguns pés de alfavaca. Novamente me deparei com aquela planta, mas naquela época eu não dei o seu devido valor, já que achava uma planta comum e não entendia muito sobre plantas medicinais, pois ainda não tinha começado a minha formação de biólogo, logo não tinha estudado sobre elas.


Pois bem, alguns anos depois eu comecei a sentir dores na região do estômago e eu desconfiava que essas dores eram resultados de alguma parasitose, tipo ameba, giárdia, lombriga, etc., adquiridas em algum trabalho de campo que fiz durante o mestrado ou em alguma viagem a passeio que fiz durante minhas férias. Então, mesmo sem ir ao médico ou fazer algum exame, fiz a coisa mais imprudente, porém a mais prática na correria do dia a dia e na dificuldade de conseguir uma consulta no SUS: eu me automediquei com o famigerado, Anita. Felizmente a dor foi passando, eu achei que tinha me livrado de qualquer parasita que tivesse se instalado no meu corpo.


Alguns meses depois, as dores voltaram, com menos intensidade, mas bastante incômodas. Portanto, não se tratava de parasitose. Fui procurar uma consulta no SUS para saber o que realmente era. Nesse tempo de espera as minhas dores iam e voltavam e o que entendi era diretamente relacionada ao meu emocional. Bom, se vamos falar de estresse, eu queria dizer que fui professor da rede estadual de São Paulo por mais de 1 ano, trabalhando com adolescentes de 15 aos 18 anos, com isso dá para saber que os padrões de estresse eram altos no meu dia a dia (rs).


É comprovado que estresse e ansiedade geram alterações fisiológicas no nosso corpo, aumentando a produção de hormônios como adrenalina e cortisol, que podem afetar diretamente o nosso sistema gastrointestinal, fazendo com que o estômago, por exemplo, libere mais suco gástrico, que em excesso afeta a sua mucosa e isso cria o ambiente perfeito para o desenvolvimento de algumas doenças.


Meses depois consegui fazer a endoscopia que acusou a presença da bactéria Helicobacter pylori, a famosa H. pylori. Devido às condições ideais causadas pelo estresse e ansiedade do dia a dia e pela minha alimentação que não era das melhores, mesmo eu me cuidando para comer bem, a H. pylori causou uma gastrite em mim. Há alguns dias eu fui ao médico e finalmente consegui a medicação para fazer o tratamento e eliminar a bactéria do meu corpo.


Nesse tempo que tive várias dores eu não morava com os meus pais, já estava morando com o meu namorado em outro bairro distante da casa da minha mãe que morava no extremo da ZL e eu na ZS de São Paulo. Quando conversava com a minha mãe, ela sempre me falava para tomar chá de alfavaca. Mas infelizmente não é uma planta tão comum como eu achava e por onde moro não encontrei em lojas de produtos naturais. Então, tive que tomar remédios para aliviar a dor.


Nas últimas vezes que fui à casa da minha mãe voltei a sentir dor e finalmente pude fazer o chá de alfavaca que foi o melhor remédio de todos, capaz de aliviar a minha gastrite mais rápido do que comprimidos, e de uma hora para outra eu estava viciado em chá de alfavaca.


Fiz esse post botânico para enaltecer e divulgar essa planta, que apesar de não ser nativa do nosso país é bastante popular por aqui, mas, ao mesmo tempo, desconhecida por muitos, sendo bastante utilizada para diversos fins medicinais pelo seu alto potencial terapêutico.


Nome científico, origem e distribuição


A alfavaca, também conhecida como alfavacão, quioiô, alfavaca-cravo ou alfavaca-branca (dependendo da região que você vive) recebe o nome científico de Ocimum gratissimum L., e pertence à família botânica das Lamiaceae que é a mesma família da hortelã, do manjericão e do orégano.


Como eu disse, não é uma espécie nativa, ou seja, não corria naturalmente no nosso território, ela foi introduzida, é uma planta exótica que foi naturalizada devido ao seu uso intenso no país e sua adaptação as condições climáticas. Ela é originária da Índia e do oeste africano, tendo sido trazida para o Brasil pelos povos africanos escravizados. Atualmente é bem difundida na África, Ásia, nas Américas tropicais e em alguns países europeus. No Brasil, tem ocorrência confirmada em diversos estados e em todas as regiões do país.




Características botânicas


Fazendo uma breve descrição, a alfavaca é um subarbusto perene, aromático, ereto, anual, de 1 a 3 m de altura, caule ereto, muito ramificado, pubescente (quando jovem), lenhoso (quando adulta); folhas opostas, ovalado-lanceoladas, delgada, pubescente, membranáceas, com bordos denteados, de 4 a 10 cm de comprimento, com pecíolos de 2 a 4,5 cm de comprimento; flores pequenas, roxo-pálidas, dispostas em racemos paniculados curtos e agrupados; fruto do tipo aquênio, com 4 sementes (tetraquênio); as sementes são pequenas, oblongas e de coloração preta.


A alfavaca possui um cheiro bem característico, pois é uma planta aromática. Morfologicamente ela é bem parecida com sua prima manjericão, que também tem aquele cheiro bem característico que lembra pizza de marguerita e molho de macarrão, só que o cheiro da alfavaca é mais parecido com o cheiro adocicado do cravo-da-índia e por isso que em alguns lugares ela recebe o nome de alfavaca-cravo. Essa característica ajuda a distinguir as primas sem nem mesmo olhar outras características como a diferença nas folhas, por exemplo, as da alfavaca são lanceoladas a elípticas, com ápice atenuado, já as do manjericão são elípticas a ovais com ápice redondo a agudo. Há quem ache que as duas plantas são uma só.



Eu particularmente acho suas flores e frutos uma graça e adorava comê-los, na verdade, faço isso até hoje. O cálice e a corola da flor, partes constituídas pelas pétalas e sépalas, possui um formato semitubular, o que me lembra um sininho. As flores são polinizadas por vários tipos de insetos, desde abelhas, moscas, formigas e vespas.


Potenciais terapêuticos e uso medicinal


As folhas, flores, frutos, sementes, caules jovens e raízes da alfavaca podem ser usadas para fazer chás, óleos ou até mesmo como tempero na comida, devido ao seu grande potencial terapêutico. Ocimum gratissimum é uma planta rica em óleos essenciais, assim como outras plantas da família a qual pertence.

Óleos essenciais são substâncias químicas encontradas nos vegetais que pertencem ao grupo dos metabólitos secundários, que são substâncias responsáveis pela defesa da planta contra herbívoros, contra microrganismos patogênicos, como fungos e bactérias, contra alguma adversidade do clima que cause algum estresse na planta ou mesmo para atrair polinizadores. A maioria desses óleos essenciais são aromáticos e liberam um cheiro característico, e, por isso, plantas como o manjericão, hortelã, e a alfavaca, são tão cheirosas.

Há registro de várias utilidades da alfavaca na medicina popular, servindo para doenças que atacam o trato respiratório como tosse e congestão nasal, problemas no trato digestivo como dores estomacais, enjoos e diarreia, problemas de pele, cólicas menstruais, ansiedade, entre outros. Na literatura científica temos vários estudos que comprovam a eficácia da alfavaca, vou deixar alguns, nas referências.

As plantas com potencial medicinal são usadas pelo ser humano há muito tempo, desde a pré-história, passando por sociedades da antiguidade como egípcios, mesopotâmios, gregos, romanos, entre outros, até as sociedades atuais. Para muitos povos tradicionais, essas plantas ainda são a principal fonte de tratamento para várias enfermidades, isso por que eles também estabelecem uma relação espiritual com a natureza e fazer o uso de plantas medicinais é parte da sua cultura.

Os remédios feitos a base de planta recebem o nome de fitoterápicos, e movimentam uma boa parcela da economia brasileira, gerando renda para diversos agricultores que vendem essas plantas. O nosso país tem uma das populações que mais faz uso desse tipo de remédio no mundo, costume que herdamos de nossos ancestrais africanos e dos povos originários. A medicina popular pelos fitoterápicos é uma alternativa para diversas pessoas, com dificuldade em ter acesso ao Sistema Único de Saúde, não possuem renda suficiente para gastar com medicamentos ou mesmo pela tradição e costumes enraizados a gerações nas famílias.

Porém, é preciso ter cautela, hein? Algumas plantas ainda precisam de mais testes para saber quais são seus constituintes químicos e verificar sua eficácia. O uso indiscriminado de algumas espécies pode ser ruim para o nosso corpo. Além disso, é importante também ir ao médico, pois a medicina popular e a medicina convencional podem ser grandes aliadas no tratamento de doenças.


No meu caso, por exemplo, a alfavaca está diretamente relacionada aos costumes da minha família, que foi passado pela minha avó e hoje é passado pelas minhas tias, minha mãe e agora, por mim, pois eu só tenho que enaltecer essa planta por acalmar várias vezes a minha gastrite. Eu já estou fazendo a minha mudinha para tê-la na minha casa, com as minhas outras filhas.

E é incrível como uma planta pode ser tão emblemática na nossa vida, né? Essa foi uma planta que esteve comigo antes mesmo de eu nascer, com os meus ancestrais, na infância até a vida adulta, e sempre que precisei ela estava lá para me ajudar com os meus problemas de saúde.

E vocês, qual ou quais plantas te despertam a memória olfativa? Vocês têm costume de usar algumas para tratar alguma coisa? Me diz nos comentários.


Referências


Mulheres das Ervas: antologia de contos, crônicas e poemas / Organização : Nágila Oliveira dos Santos Quissamã: Revista África e Africanidades, 2021.


PEREIRA, C.A.M.; MAIA, J.F. Estudo da atividade antioxidante do extrato e do óleo essencial obtidos das folhas de alfavaca (Ocimum gratissimum L.). Ciência e Tecnologia de Alimentos, v.27, n.3, p.624-32, 2007.



Antar, G.M. Ocimum in Flora e Funga do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro.Disponível em: <https://floradobrasil.jbrj.gov.br/FB23332>. Acesso em: 10 jan. 2023.


SILVA, L.L. Composição química e atividades biológicas de Ocimum gratissimum L. Dissertação (mestrado em farmacologia), Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2009.



BRASIL, Ministério da Saúde. Monografia da espécie Ocimum gratissimum L. (alfavaca). Brasília, 2015.




 
 
 

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